O governo anunciou, no mês passado, mudanças na legislação previdenciária para possibilitar um novo pente-fino em benefícios pagos pelo INSS. Com isso, haverá análise de benefícios com indícios de irregularidade, como pensão por morte e auxílio reclusão, e revisão de benefícios por incapacidade, como auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.

Apesar de o Congresso ter o prazo de 120 dias para transformar a medida em lei, ela já pode ser colocada em prática. Questionada sobre quando vai começar efetivamente o pente-fino nos benefícios contemplados pela Medida Provisória (MP) anunciada no dia 18 de janeiro, a Secretaria da Previdência, ligada ao Ministério da Economia, informou que "os procedimentos e detalhamento operacional da convocação para as revisões serão estabelecidos em ato normativo que deve ser publicado em breve".

No governo Temer, já foi feita fiscalização no auxílio-doença e na aposentadoria por invalidez. Em dois anos, o pente-fino cancelou 80% dos benefícios de auxílio doença revisados e 30% das aposentadorias por invalidez.

Convocação e prazo de defesa

Se cair no pente-fino, o segurado que não apresentar defesa prévia ou não for localizado dentro de um prazo de 10 dias, após ter sido notificado, poderá ter seu pagamento cortado ou suspenso. A comunicação do indício de irregularidade vai ocorrer por meio da rede bancária em que o segurado recebe o benefício, por meio eletrÒnico ou por carta simples.

Se houver suspensão do benefício, o segurado terá prazo de 30 dias para interposição de recurso administrativo, segundo João Badari, especialista em direito previdenciário e sócio do Aith, Badari e Luchin Advogados. Caso não apresente o recurso dentro do prazo, o benefício será cortado. Além disso, o INSS pode suspender o benefício caso a defesa seja considerada insuficiente ou improcedente.

O advogado ressalta que cada caso exige um tipo de cuidado ou defesa.

"São inúmeras as situações que o INSS pode alegar como fraude ou irregularidade. E, caso o convocado não tenha conhecimento técnico para se defender, deve procurar um advogado especialista. Importante o segurado apresentar todos os documentos que comprovem seu direito de receber o benefício, tanto para o INSS como posteriormente para seu advogado", alerta.

Segundo ele, o INSS vai cruzar as informações do segurado com os dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), que traz todos os vínculos trabalhistas e previdenciários, com informações como períodos trabalhados, remunerações recebidas e contribuições para a previdência. Com essa medida, o INSS saberá, por exemplo, se o salário que o segurado recebia está de acordo para ter direito ao auxílio-reclusão.

"O CNIS constitui prova de renda. O INSS pode descobrir que o segurado recebe aposentadoria por invalidez, mas se encontra trabalhando e auferindo renda", exemplifica.

Ainda serão realizadas perícias nos casos dos benefícios por incapacidade, para aqueles que não passaram por perícia há mais de 6 meses ou não têm data de cessação do benefício estipulada. No caso de Benefício de Prestação Continuada (BPC/Loas), serão convocados os beneficiários com incapacidade que há mais de 2 anos não passam por perícia médica.

"Perícia vai haver em todos os casos em que seja necessário comprovar se o segurado ainda está incapacitado para o trabalho, não envolve requisitos objetivos documentais que possam ser auferidos pelo CNIS. A perícia vai acontecer para atestar a condição de saúde do segurado, seja ela física, psíquica e até mesmo social", explica Badari.

Veja abaixo algumas situações que podem levar o segurado ao pente-fino do INSS:

Auxílio-reclusão

detento recebe aposentadoria detento não possuía qualidade de segurado no momento da prisão detento recebia mais que o teto legal no momento da prisão

Pensão por morte

morte de pessoa que não tinha mais qualidade de segurado uso de declaração falsa para comprovar a dependência beneficiário que recebe mais de uma pensão por morte de mesma classe -é possível acumular pensões, desde que sejam de classes diferentes marido de beneficiária não contribuía há mais de 12 meses na data do óbito

aposentadoria rural

segurado tinha vínculo urbano no CNIS e o utilizou como tempo no campo segurado rural possuía CNPJ aberto e utilizou esse período como tempo para obter o benefício

BPC -LOAS

idosos e deficientes com mais de 65 anos que trabalham e não se encontram em situação de miserabilidade

Badari ressalta que essas situações não levarão ao cancelamento do benefício, mas os indícios farão o INSS convocar o aposentado ou beneficiário para se explicar.

Da mesma forma, se o INSS detectar que o segurado recebeu um benefício indevido ou um valor maior do que deveria receber, todos os valores deverão ser devolvidos. Badari dá como exemplo uma pessoa que tem aposentadoria de R$ 2 mil e o INSS por erro pagou R$ 2,5 mil durante um ano. Ela deve devolver os R$ 6 mil a mais recebidos. "Ou imagine que minha aposentadoria de R$ 2 mil era ilegal, devo devolver tudo que recebi irregularmente", comenta.

Cuidados a serem tomados

Para não perder o prazo de defesa, o advogado aconselha ficar atento aos avisos do INSS. Veja as dicas do advogado:

Fique atento a correspondências enviadas pelo INSS e aos avisos dos terminais bancários para saber o que o INSS está alegando como motivo para suspender o benefício ou cancelar o pagamento. Não perca o prazo de resposta. Caso o INSS entenda que o benefício não deve mais ser pago, é possível apresentar de forma administrativa o recurso da decisão - o prazo é de 30 dias. Nas perícias nos casos dos benefícios por incapacidade, é importante levar laudos médicos recentes, atestados, receitas de remédios, prontuários solicitados no hospital e exames que atestam a incapacidade, pois é por meio dos documentos apresentados e da avaliação na data agendada que o perito do INSS poderá conceder a renovação do pagamento mensal. Se mesmo com o recurso o benefício for cessado, procure um especialista no assunto, pois ele poderá encontrar caminhos legais que fundamentarão o pedido judicial para o benefício ser restabelecido, além do pagamento dos atrasados (devolução dos valores que o INSS deixou de pagar desde o corte) e a eventual ação de inexigibilidade do débito (para não permitir que o INSS cobre valores recebidos). Quando procurar a Justiça

Badari considera a medida do governo importante para levar moralidade ao pagamento de aposentadorias e pensões, evitando fraudes e levando economia aos cofres públicos. Mas ele espera que não existam cortes ilegais de pessoas que recebem legalmente do INSS. "Como ocorreu na revisão dos benefícios por incapacidade, em que muitos segurados incapacitados foram declarados capazes e obrigados a voltar doentes para o mercado de trabalho para conseguir sobreviver", diz.

Nesses casos, o advogado da área previdenciária orienta buscar um advogado especialista, que irá analisar o caso e, se entender que existe erro no cancelamento, deverá ajuizar ação pedindo o não pagamento ao INSS dos valores cobrados, o restabelecimento dos pagamentos dos benefícios e a devolução de todos os valores que deixou de pagar desde que cortou o benefício, corrigidos.

A nova regra estabelece prazo de 10 anos para os segurados reclamarem na Justiça os benefícios negados pelo INSS.

Veja como ficam os benefícios do INSS com as mudanças, segundo Badari:

Benefícios por incapacidade

Os aposentados por invalidez e beneficiários de auxílio-doença que não passam por perícia há mais de 6 meses serão convocados para uma nova avaliação. Isso não quer dizer que o benefício será cancelado, e sim que deverá ser feita nova perícia para constatar se ainda se encontra incapaz para o trabalho.

Com a MP, continua isento de fazer nova perícia o aposentado com mais de 60 anos, mas passa a ser obrigatória a quem tem mais de 55 anos e 15 anos de trabalho.

No caso do BPC, quando o benefício é destinado a pessoas com deficiência, o prazo será de 2 anos sem perícia realizada.

Qualidade de segurado

Para retomar a qualidade de segurado e ter direito aos benefícios, o segurado deverá cumprir um período maior de carência (número mínimo de contribuições para obter o benefício) para conseguir ter direito aos benefícios por incapacidade (auxílio-doença e aposentadoria por invalidez), salário-maternidade e auxílio-reclusão.

No caso do auxílio-reclusão, a carência será de 24 meses. O auxílio-doença terá prazo de carência de 12 meses.

A regra atual, que foi mantida, estabelece que a perda da qualidade do segurado se dá após 12 meses sem contribuição ao INSS, mas o prazo pode ser estendido por mais 12 meses caso o segurado comprove que estava desempregado no período. E por mais 12 meses se o segurado demonstrar que contribui por mais de 10 anos para o INSS.

Salário-maternidade

Para ter direito, o benefício deve ser requerido ao INSS no prazo de 180 dias após o parto ou a adoção - antes o prazo era de 5 anos.

Ou seja, a segurada que não requisitar em até 6 meses perderá o direito ao salário-maternidade. De acordo com Badari, há diversos os casos em que as mães pedem o salário-maternidade depois de 2 ou 3 anos, pois desconhecem o direito de receber o benefício.

Auxílio-reclusão

Será devido apenas em caso de recolhimento do segurado no regime fechado do cumprimento da pena, e não mais o regime semiaberto.

Antes da MP era apurado como limite de renda para o recebimento do auxílio-reclusão o valor do último salário do segurado que foi preso. Agora serão considerados os 12 últimos salários para enquadrar como baixa renda.

Benefício de Prestação Continuada (BPC/Loas)

O requerimento, a concessão e o "pente-fino" ficam condicionados à autorização de acesso a dados bancários pelo cidadão que está requerendo o benefício assistencial(este ponto passa a vigorar após 90 dias da publicação da MP).

Pensão por morte

A MP estabelece prazo de 180 dias após a morte do segurado para que os filhos menores de 16 anos façam o pedido de pensão. Isso não quer dizer que após 6 meses não terão direito ao benefício, mas sim aos atrasados desde a morte (retroativos).

Trabalhador rural

A declaração de sindicatos rurais não será mais válida para comprovar o tempo de trabalho rural, tornando-se imprescindível a Declaração de Aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, emitida por entidades conveniadas com o Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (Pronater). E, a partir de 2020, o sistema de cadastro dos trabalhadores rurais no CNIS será o único documento válido para comprovação do direito de obter a aposentadoria rural do trabalhador especial.

União estável

A prova de união estável e de dependência econÒmica exige início de prova material contemporânea dos fatos, não sendo admitida apenas a prova testemunhal (exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito).

Prova de vida

Anualmente os segurados que recebem benefícios deverão comprovar para o INSS que estão vivos.

Certidão do tempo de contribuição (CTC)

A emissão da Certidão de Tempo de Contribuição com o registro de tempo de serviço será vedada caso não haja a comprovação efetiva, exceto para o segurado empregado, empregado doméstico e trabalhador avulso. Fonte: Mix Vale